STF: Mato Grosso cria cadastro de condenados por pedofilia e violência contra a mulher.

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

POR: André Luciano Vicente da Silva

Resumo do caso

Trata-se de decisão do Supremo Tribunal Federal proferida na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 6620, proposta pelo Governador do Estado do Mato Grosso, em face das Leis Estaduais 10315/19 e 10915/19, advindas do Poder Legislativo do respectivo Estado. Ambas regulam o cadastro de pessoas, sendo que a primeira se reporta à indivíduos suspeitos, indiciados e condenados por crimes contra a dignidade sexual da criança e do adolescente e, a segunda, de pessoas condenadas por violência contra a mulher.

Ao fim do julgamento, ficou definido que o cadastro de pedófilos e condenados por violência contra a mulher é legitimamente constitucional. O Ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, determinou, apenas, algumas alterações, tais como a modificação no texto da Lei 10315/19, no sentido de constar no cadastro apenas os condenados, excluindo-se os “suspeitos e indiciados”, bem como a retira de qualquer informação que facilitasse a identificação da vítima, mesmo que para membros dos órgãos de segurança, salvo por medida judicial.

Dos motivos da propositura da ADI

O Governador sustentou, na propositura da ADI, que haveriam vícios de natureza formal e material na edição das leis, sendo o vício formal postulado, na sua visão, de que ambas as leis versavam sobre matéria penal, que seriam de competência privativa da União, conforme dispõe o Art. 22, I da Constituição Federal. Atribuiu também vício material na formalização das leis, já que em tese criaria uma obrigação para a Secretaria de Segurança Pública, órgão administrativo, sem que se observasse a separação dos poderes, previsto no Art. 2º da CF.

Sem prejuízo ao já disposto, manifestou que em ambas as leis haveriam violações às garantias fundamentais individuais, não só dos réus condenados, mas também, das vítimas e seus familiares. Destacou, sobretudo, os princípios da dignidade humana, previsto no 1º Art. da CF, e, ainda, os previstos no Art. 5º da CF, relativos à proibição do tratamento desumano e degradante, princípios da função social da pena, da integridade física e moral, da responsabilidade pessoal e, por final, o princípio da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem.

Do julgamento

De maneira unânime, entre os membros do Tribunal, ficaram declarados válidos e constitucionais os cadastros daqueles que fossem condenados, após sentença definitiva transitada em julgado, por crimes de pedofilia e de violência contra a mulher. Assim, restou superada qualquer possível violação de princípios e garantias fundamentais do condenado, com relação à publicidade de tais dados, trazendo para a sociedade um maior senso de segurança, no que diz respeito aos crimes de grande repugnância dentro do convívio social.

No voto de Alexandre de Moraes, que foi acompanhado pelos demais Ministros, o cadastro destes criminosos atende aos princípios da adequação, da razoabilidade e da proporcionalidade, compatibilizando as garantias do réu e com os demais direitos fundamentais da sociedade.

Arguiu-se, durante o curso do julgamento, que fosse respeitado o princípio da presunção da inocência, no sentido de que fosse retirado do texto da lei, a possibilidade de constarem nesse banco de dados, aqueles que ainda fossem suspeitos e indiciados, do contrário, a norma iria contra o texto constitucional, em seu Art. 5º, LVII, que prevê que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, neste prisma retirou-se da lei os termos acima citados.

Ainda, houve alteração, por solicitação do Ministro Flávio Dino, no sentido de que tais dados estejam visíveis até o fim do cumprimento da pena e não até a reabilitação judicial, conforme dispunha a lei. Na avaliação de Dino, o prazo final mais curto visa não comprometer a ressocialização do condenado.

No que tange a uma possível inconstitucionalidade de natureza formal, por não haver a possibilidade de um Estado Federativo legislar sobre norma penal, o Ministro Moraes argumentou que, no caso em questão, não se trata de matéria penal e sim de matéria de segurança pública, o que recairia no Art. 22 da CF, que dispõe sobre as competências concorrentes entre União e Estados, não havendo óbice para que o Estado do Mato Grosso legislasse sobre o assunto.

E para finalizar as possíveis discordâncias levantadas, o relator resolveu a questão relativa a possibilidade de incompetência de natureza material, cujo argumento era de que a lei, oriunda do Poder Legislativo, criava obrigações para um órgão do Poder Executivo, fato que violaria a separação dos poderes. Em levantamento da jurisprudência, da própria Corte, já há o entendimento, bem fundamentado, de que só ocorre a invasão de competências de poderes distintos, quando há aumento de despesa e/ou modificação das atribuições funcionais de agentes públicos ou órgãos da Administração Pública. Sendo assim, restou julgado que a simples publicidade de dados, que já fazem parte dos processos realizados pela Secretaria de Segurança Pública, não acarretaria em qualquer violação entre os poderes.