Protagonismo do juízo atenta com o sistema acusatório
Por: Josiene Dias Barbosa
A 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por unanimidade, anulou processo criminal desde a audiência de instrução, por entender que houve violação ao sistema acusatório, após juíza de primeiro grau tomar para si o protagonismo da inquirição de testemunhas, ante a ausência justificada do Ministério Público à audiência, o que fere os princípios do artigo 212 do Código de Processo Penal.
Entenda o Caso
Nos autos de ação penal, o Ministério Público denunciou Richardson Correa Lara, como incurso nas sanções dos artigos 33, caput, c/c 40, VI, ambos da Lei nº 11.343/06, por haver sido surpreendido transportando 47,38 gramas de crack, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
Na audiência de instrução e julgamento, restou comprovada a ausência justificada do Parquet e a juíza deu prosseguimento ao ato, atuando em substituição ao órgão acusatório, em desacordo com a reforma do Código de Processo Penal realizada por meio da Lei 11.690/2008, o que foi registrado em ata em protesto da defesa.
Após a instrução probatória o réu foi condenado à pena de 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão, no regime inicialmente semiaberto e 550 dias-multa.
Inconformada, a defesa interpôs Apelação Criminal Nº 1.0000.23.002111-5/001, sustentando, preliminarmente, a nulidade do feito desde a audiência de instrução, argumentando que o juízo de primeiro grau não pode tomar para si o protagonismo da audiência probatória em substituição ao órgão de acusação, pois é destinatário da prova e não seu produtor, devendo atuar apenas para complementar e sanar os pontos obscuros durante a inquirição de testemunhas, conforme preceitua o parágrafo único do artigo 212 do Código de Processo Penal.
O Desembargador Fortuna Grion, relator do caso, concordou com a tese arguida pela defesa e frisou que o juízo de primeiro piso, “ao tomar para si o protagonismo da audiência, iniciando e formulando as perguntas de forma principal — e não complementar — acabou por violar o sistema acusatório”, e ainda ressaltou que, durante a audiência, a defesa protestou contra o protagonismo da juíza, o que foi registrado em ata.
Fortuna Grion, em seu relatório, apresentou duas soluções viáveis que podem ser adotadas pelo juízo de primeiro grau, em razão de ausência justificada do Parquet à audiência de instrução: a) suspender a audiência e marcar uma nova data; ou b) dar a palavra à defesa para suas perguntas e, de forma complementar, inquirir as testemunhas, no objetivo de sanar “pontos não esclarecidos”.
Da Decisão
Restando demonstrado que a condenação se lastreou, primordialmente, nos elementos colhidos na audiência de instrução, bem como os prejuízos suportados pela defesa, a 3ª Câmara Recursal acolheu a preliminar para anular o processo desde a audiência de instrução, devendo ser repetido o ato processual, prosseguindo a ação penal nos demais termos até a sentença.
PROCESSO RELACIONADO: Apelação Criminal Nº 1.0000.23.002111-5/001