STF: Não comete infração penal o porte para consumo pessoal da substância cannabis sativa (maconha), sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

Por: Maria Eduarda Borges Monteiro Costa

 

No último dia 26 de junho de 2024, o Plenário do Supremo Tribunal Federal formou maioria e definiu a tese de repercussão geral no RE 635659 que considerou não cometer infração penal o porte para consumo pessoal de maconha. Nesse sentido, será presumido usuário quem, para consumo próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito.

A maioria da Corte entendeu que o porte de maconha não deve ser considerado crime, mas sim uma sanção administrativa, sem consequências penais, como registro na ficha criminal, por exemplo. À vista disso, além da apreensão da droga, as sanções administrativas aplicadas seriam as que estão previstas na Lei nº 11.343 (Lei De Drogas), ou seja, advertências sobre o uso da droga (art. 28, I) e medida de comparecimento à programa ou curso educativo (art. 28, III).

A presunção mencionada anteriormente é relativa. Dessa maneira, a autoridade policial e seus agentes não estão impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo quando se tratar de quantidades inferiores ao limite estabelecido, desde que estejam presentes elementos que indiquem intenção de mercancia. Estes aspectos podem incluir a forma de embalagem da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, bem como a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes.

O delegado de polícia deve explicar detalhadamente as razões para rejeitar a presunção de porte para uso pessoal e não pode fundamentar sua decisão em critérios arbitrários, sob risco de responsabilização. Além disso, o juiz encarregado do caso pode, em situações envolvendo apreensão de quantidades acima de 40 gramas, descartar a classificação como crime, se houver evidências suficientes de que a pessoa é usuária.

Conforme decisão, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em articulação com o Executivo e o Legislativo, deverá adotar medidas para cumprir a decisão, além de promover mutirões carcerários com a Defensoria Pública para corrigir prisões que tenham sido decretadas fora dos parâmetros determinados pelo Plenário. O colegiado também fez um apelo para o aprimoramento das políticas públicas destinadas ao tratamento de dependentes de drogas, com ênfase na recuperação contínua dos usuários, visando evitar a estagnação.

Segundo o Ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF: “Ninguém no Supremo Tribunal Federal defende o uso de drogas. Pelo contrário, nós desincentivamos o uso de drogas. Drogas ilícitas são uma coisa ruim (…). Estamos debatendo a melhor forma de enfrentar esse problema e minimizar suas consequências para a sociedade. E constatamos que a não fixação de uma quantidade distintiva tem sido uma má política pública”. Segundo Barroso, a definição desse parâmetro para distinguir usuário de traficante vai evitar que o excesso de encarceramento “forneça mão de obra para o crime organizado nas prisões brasileiras” (STF, RE 635659).

Dessa forma, o Recurso Extraordinário em questão, à luz do art. 5º, X, da Constituição Federal, entendeu pela não compatibilidade do art. 28 da Lei 11.343/2006, que tipifica o porte de drogas para consumo pessoal, com os princípios constitucionais da intimidade e da vida privada em relação à substância cannabis sativa.