STJ: A exigência de exame criminológico (Lei n. 14.843/2024) não retroage para crimes que lhe são anteriores.
POR: Adriana Dias da Silva
Na esfera do Habeas Corpus Nº 936127 do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), a parte interessada, Gustavo Cesar Ferreira Santos impetrou writ, visando garantir a proteção de seu direito de locomoção.
O paciente atualmente preso solicitou a reconsideração de uma decisão anterior do STJ do Estado de São Paulo, que havia determinado a realização de um exame criminológico para a progressão de regime, conforme prescrito na Lei nº 14.843/2024. Essa exigência gerou a alegação de coação ilegal. Segundo a defesa, a nova legislação não poderia ser aplicada retroativamente aos casos em que o réu teria praticado o crime antes de sua vigência. Nestes termos, a defesa busca a progressão do apenado para o regime aberto, sem a exigência de exame criminológico.
A análise da demanda e do relator Ministro Rogério Schietti Cruz, trouxe importantes considerações sobre a aplicabilidade da Lei nº 14.843/2024, e os princípios que regem as normas processuais penais.
Primeiramente a jurisprudência e a legislação atual que tratam que o exame criminológico deixou de ser uma condição obrigatória para a progressão de pena com a promulgação da Lei nº 10.792/2003. Não obstante, tal legislação permitiu a sua realização, desde que fundamentada em elementos concretos da execução de pena.
A decisão em primeira instância havia determinado ao reeducando a realização do exame criminológico como condição para progressão de regime, sustentando tratar-se de norma processual, que, em razão desta natureza, não é limitada pelo princípio da anterioridade em matéria penal.
O relator ressaltou que o art. 112, § 1º, da Lei de Execução Penal (LEP) estabelece para a progressão de regime a análise da boa conduta carcerária e a eventual realização do exame criminológico têm que respeitar o contexto estadual e histórico do cumprimento de pena. Salientou ainda que, considerando que a progressão de regime tem impacto na execução da pena e em sua severidade, a norma que impõe condições para a concessão tem natureza penal, devendo, portanto, ser submetida aos imperativos do princípio da legalidade em matéria penal. No caso analisado, considerando que o apenado cometeu os delitos antes da vigência da norma da Lei nº 14.843/2024, tal fato inviabilizaria a aplicação da mesma de forma retroativa, em conformidade com o art. 5º, XL, CF.
Não sendo aplicada a nova lei mais gravosa (que impõe a obrigatoriedade do exame criminológico), fica o apenado submetido aos critérios estabelecidos pela legislação anterior, que demanda que o exame criminológico, não sendo obrigatório para a progressão para o regime aberto, somente pode ser solicitado pelo juízo mediante fundamentação idônea.
Sendo assim, a simples referência à gravidade do crime e à extensão da pena não podem ser considerados como justificação isolada para determinar a realização do exame criminológico, visto que não são elementos suficientes para afirmar que o apenado não tem condições de se reintegrar em nova situação jurídica. A motivação apresentada pelo Juiz da Vara de Execução Criminal (VEC) careceria de fundamentação mais aprofundada, não analisando efetivamente os fatores que caracterizam a falta de ajustamento penal.
Dessarte, com o objetivo de garantir o respeito, a legalidade e a individualização das penas, o relator decidiu pela concessão do habeas corpus, permitindo que o paciente não seja submetido ao exame criminológico de forma irregular. A decisão permitiu que o Juiz da VEC reexamine o pedido de progressão considerando requisitos legais existentes, sem rebater análise de sua boa conduta carcerária ou fundamentações não relacionadas ao contexto penal concreto.
Mediante o exposto, essa decisão reafirma a importância do respeito às normas processuais e aos direitos constitucionais, principalmente onde as consequências da aplicação de leis mais severas não podem ser impostas de forma retroativa sem a adequada fundamentação.
PROCESSO RELACIONADO: STJ – Habeas Corpus Nº936127