STJ: Financiamento imobiliário não é relação de trato sucessivo
POR: MARCELO GOMES DA SILVA JUNIOR
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Agravo Interno no Recurso Especial n. 1.837.718/PR, julgado pela quarta turma, decidiu que o parcelamento de saldo devedor nos contratos de financiamento imobiliário não configura relação de trato sucessivo.
O agravo foi interposto pela Companhia de Habitação de Londrina Cohab Ld em face de decisão que negou seguimento ao recurso especial contra acórdão julgado pelo TJPR, que tinha por objetivo discutir o início do prazo prescricional para a cobrança de dívidas em contrato de mútuo do sistema financeiro de habitação.
No acórdão decidiu-se que o contrato realizado entre a Companhia de Habitação de Londrina Cohab Ld junto a Elsa da Silva Mostaco tratava-se de contrato de trato sucessivo e, portanto, todas as parcelas vencidas há mais de cinco anos da distribuição da ação estavam sujeitas à prescrição de acordo com art. 206 § 5º, I, do Código Civil.
No primeiro voto, o Excelentíssimo Senhor ministro Raul Araújo (Relator), concordou com o entendimento do Acórdão sobre o prazo prescricional, ou seja, a execução hipotecária proposta para a cobrança de crédito vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação possui prazo prescricional de 5 (cinco) anos. Entendimento previsto também no artigo 206, § 5º, I, do Código Civil, seguido pela corte que, entendeu que nas obrigações de trato sucessivo, o prazo é contado a partir do vencimento de cada parcela, de modo que a prescrição atinge as parcelas vencidas no quinquênio anterior ao ajuizamento da ação, julgamento consonante com a jurisprudência do Enunciado 83 da Súmula do STJ. Dessa forma, o Relator negou provimento ao agravo interno.
Após pedido de vistas, a Ministra Maria Isabel Gallotti, discordou do entendimento do ministro relator Raul Araújo ao dizer que a conclusão do tribunal paranaense não esta de acordo com a jurisprudência consolidada do STJ, afastando a ocorrência da súmula 83/STJ, complementando que o sistema de amortização do saldo devedor dos contratos de financiamento imobiliário não configura relação de trato sucessivo provendo sim de uma única obrigação o pagamento do valor de empréstimo contraído para compra de imóvel, pagamento que deverá ser realizado de forma parcelada nas datas pactuadas em contrato, a benefício do devedor, que tem a obrigação de pagar o valor total do empréstimo até o termo do contrato.
As parcelas não pagas na data dos respectivos vencimentos incrementam o valor da dívida a ser quitada, não se tratando de parcelas que se renovam mês a mês, como aluguel e salário, por exemplo, concluindo que não é a data da contratação, nem a do inadimplemento de cada parcela do preço, que dão início ao prazo prescricional, mas a data final para quitação do saldo devedor.
Após voto-vista da ministra Maria Isabel Gallotti, o ministro relator Sr. Raul Araújo mostrou-se ter se equivocado quanto ao seu voto, demostrando estar com a razão a referida ministra, entendendo que o caso se trata de “… uma obrigação única, relativa ao pagamento do valor do empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, quantia já disponibilizada pela instituição financeira. O parcelamento do pagamento, em benefício da parte devedora, nas datas de vencimento pactuadas no contrato, não configura relação de trato sucessivo decorrente de obrigações periódicas, que se renovam mês a mês. A obrigação de pagamento do valor financiado é única, devendo ser quitada a integralidade do valor financiado até o termo do contrato”, modificando seu voto e dando provimento ao agravo interno para dar provimento ao recurso especial, a fim de afastar a prescrição, pois o início da contagem do prazo prescricional ocorreria somente com o vencimento da última parcela.
Assim, após o voto-vista da Ministra Maria Isabel Gallotti dando provimento ao agravo interno, para dar provimento ao recurso especial, divergindo do relator, e a retificação do voto do relator para acompanhar a divergência, a Quarta Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento ao agravo interno para dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do relator. A Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti (voto-vista) e os Srs. Ministros Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
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