STJ: É possível adoção mesmo que a diferença etária entre adotado e adotante seja inferior a 16 anos

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

Por: Sarah Castelo Vaneli

A adoção deve seguir os mesmos princípios de respeito e confiança que, costuma-se considerar, devem reinar no seio de uma família.

No presente caso, o requerente interpôs recursos especiais visando à reforma do acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF), que manteve negado o pedido de adoção da petição inicial. Decisão que fora negada em face do caráter cogente da norma prevista no art. 42, § 3° da Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA) que prevê a distância etária mínima de 16 (dezesseis) anos entre adotante e adotando para a viabilização da adoção.

O caso concreto deste acórdão baseia-se na manifestação de vontade no processo de adoção unilateral socioafetiva de enteado por padrasto, tendo em vista que o adotante é casado com a genitora do adotando, sendo este ainda filho de pai desconhecido, e convive com o adotante desde pouca idade. O adotante ainda possui dois filhos biológicos com a esposa, motivo pelo qual, na realidade dos fatos, já atua como pai, estando ainda o adotando em sua guarda fática desde os 2 (dois) anos de vida.

O autor interpôs o recurso com base no art. 105, III, alínea “c”, da Constituição Federal, apontando assim uma controvérsia na jurisprudência em relação à forma interpretativa e à aplicabilidade da norma do art. 42 § 3°, do ECA. Conforme a decisão jurisprudencial de vários tribunais pátrios, a diferença mínima de idade entre as partes relacionadas pode ser flexibilizada, diante do caso concreto apresentado, em benefício do menor, por tratar-se de mera formalização de uma situação fática.

Por outro lado, o Ministério Público do Distrito Federal (custos legis), recorreu da decisão baseando-se no art. 105, III, “a”, da Constituição Federal, afirmando violados os art. 42 § 3° do ECA e arts. 267, VI e 295 I do Código de Processo Civil. Com os quais reafirma a disparidade de diferença de idade entre as partes.

Contudo, essa diferença etária não seria norma de ordem pública, podendo ser flexibilizada conforme as particularidades de cada caso, e o seu regramento pode ser mitigado após a oitiva das partes interessadas, apurando-se as reais vantagens ao adotando e os motivos legítimos do ato. Ademais, certamente o sentimento não se encontra vinculado à idade e pode existir entre pessoas com diferença etária inferior aos dezesseis anos exigidos pelo legislador, conforme a interpretação do STJ. Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), por diversas vezes tem reconhecido a extensão das normas prevista no ECA em interesse do bem-estar do menor, levando em consideração a observância do art. 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual assegura que a interpretação dessa Lei deve levar em conta os fins sociais para quem se dirige, o bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoa em desenvolvimento. Portanto, trata-se de uma Lei interpretativa e condicionada ao caso concreto.

Sendo assim, é possível a relativização da diferença etária mínima de 16 anos na adoção em questão quando se constata que a adoção visa formalizar uma situação fática estabelecida publicamente, contínua, estável, concreta e duradoura. Além do mais, o direito à filiação é personalíssimo e fundamental, baseado nas normas constitucionais do princípio da dignidade humana. Por estas razões, a corte concedeu o direito de adoção unilateral interposta pelo adotante, com a intenção de formalizar uma situação fática vivenciada pela família.