STJ: Impossibilidade de citação por meio de mídias sociais.

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

Por: André Luciano Vicente da Silva

Relatório do caso

Cuida-se de Recurso Especial Nº 2.026.925 – SP (2022/0148033-2), interposto por CARBINOX INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA., com base no art. 105, III, alíneas “a” e “c”, da Constituição Federal, contra o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que negou provimento ao agravo de instrumento por ela interposto na ação de execução de título extrajudicial proposta pela recorrente contra BRUNO SCHAREMBERG RAMOS ME, em 04/04/2016.

A decisão interlocutória indeferiu o pedido de citação do recorrido por meio de redes sociais por ausência de previsão legal.

O acórdão do TJ/SP negou provimento ao agravo de instrumento, nos termos da seguinte ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. PEDIDO DE CITAÇÃO E INTIMAÇÃO POR REDE SOCIAL. INDEFERIMENTO EM 1º GRAU. DECISÃO MANTIDA. IMPOSSIBILIDADE DE REALIZAÇÃO DE COMUNICAÇÃO PROCESSUAL POR MEIOS NÃO PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO. RESPEITO AOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA AMPLA DEFESA. RECURSO DESPROVIDO.

Em sede de Recurso Especial, foi alegado, em síntese, violação dos Arts. 270 e 277, ambos do CPC/15, e do art. 5º, § 5º, da Lei nº 11.419/2006, com o fundamento de que haveria autorização legal para a prática do ato citatório por intermédio das redes sociais do recorrido e, ainda que assim não fosse, deveria privilegiar o princípio da instrumentalidade das formas.

Em juízo prévio de admissibilidade o TJ/SP inadmitiu o Recurso Especial da recorrente, tendo sido interposto o respectivo agravo, convertido para melhor exame da matéria de fundo, especialmente porque o óbice apontado pela Presidência desta Corte para inadmitir o Recurso Especial (referência ao agravo do art. 1.015 e não ao agravo do art. 1.042) era meramente formal, na medida em que a peça apresentada era, em verdade, o agravo contra a decisão que inadmite o recurso especial.

Quanto à solenidade da citação

O CPC – Código de Processo Civil (Lei 13.105/2015) traz em seu rol todas as formas solenes que podem ser realizadas para que a citação do réu ocorra de maneira segura e gere seus efeitos processuais, dentre as quais principalmente a integração do réu ao processo. A primeira, disposta no Art. 246 do CPC (que foi editado em 2021), que é a citação via e-mail, é a via preferencial para a realização do ato, partindo então subsidiariamente para a citação via correio, por oficial de justiça, pelo comparecimento espontâneo em juízo e a citação por edital em último caso. Percebe-se que a única via eletrônica disposta em lei, até o presente momento, é através do e-mail, seja informado pelo autor da ação, seja aquele disposto no banco de dados do Poder Judiciário. Qualquer outra forma de citação que não se encontre disposta no CPC há de ser considerada nula, exceto em casos em que se pode utilizar o princípio da instrumentalidade das formas, previsto no Art. 277 do mesmo código, que trata sobre a possibilidade que o juiz tem de convalidar um ato que não tenha sido realizado de maneira formal, mas que por determinado motivo tenha atingido seu objetivo.

Entretanto, o Conselho Nacional de Justiça, no ano de 2020, publicou a resolução nº 354 que em seu Art. 8º dispõe que “nos casos em que cabível a citação e a intimação pelo correio, por oficial de justiça ou pelo escrivão ou chefe de secretaria, o ato poderá ser cumprido por meio eletrônico que assegure ter o destinatário do ato tomado conhecimento do seu conteúdo”. Deve-se salientar que a resolução acima foi formulada no contexto da pandemia de coronavírus e, pelas limitações trazidas por esta, abriram-se brechas para que os Tribunais e as Comarcas distribuídas pelo território nacional tratassem de forma interna sobre o tema, o que gerou uma falta de uniformização geral e procedimentos distintos quanto à validade dos atos processuais.

Discussão sobre o tema

Quanto ao Recurso Especial disposto acima, traz à tona um debate que já tem espaço nas discussões legislativas há um certo tempo e sobre o qual não indicou-se disposição quando houve a alteração do Art. 246, que é a utilização das redes sociais para a realização da citação do réu no curso da relação processual. Neste caso, a recorrente, Carbinox Indústria e Comércio LTDA, propôs que devido à dificuldade em se encontrar o recorrido, Bruno Scharemberg Ramos, caberia então identificá-lo em suas redes sociais e se utilizar das mesmas para a realização da citação.

A relatora do caso tratou sobre dois pontos específicos quanto ao pedido para negar-lhe provimento. O primeiro é que o próprio código já traz, no §1º do Art. 246, quais seriam as outras formas a serem utilizadas caso a citação por correio eletrônico não ocorresse por qualquer motivo que fosse. Em segundo, algo mais complexo, refere-se à falta de garantia que a citação via rede social traria, haja visto que há uma grande facilidade em se criar perfis falsos ou homônimos e à dificuldade de se garantir que aquele perfil pertença realmente àquela pessoa, ademais da própria falta de autorização legal para o mesmo.

Como dito anteriormente, apesar de a disciplina da citação ter sido alvo de uma mudança recente já com o objetivo de atualizar a forma de realização da mesma que é trazer o processo para o mundo contemporâneo e ainda ter o ganho de facilitar a realização do ato, dando ainda mais celeridade ao procedimento, a mudança se limitou à inclusão da possibilidade da via eletrônica do e-mail e não tratou sobre a utilização das redes sociais para o mesmo. Com o mundo cada vez mais digital, sente-se que essa já é uma mudança defasada e que o processo só tem a ganhar com a utilização de mais meios eletrônicos para a realização de seus procedimentos. E é nesse tema que o projeto de lei 1595/2020 que tramita no Poder Legislativo buscará trazer uma atualização mais adequada ao Art. 276 do CPC em busca de uniformizar o tema para o Poder Judiciário como um todo.

PROCESSO RELACIONADO: Recurso Especial Nº 2.026.925 – SP (2022/0148033-2)