STJ: Medo ao ver viatura policial não é fundamento idôneo para busca pessoal
POR: Josiene Dias Barbosa
Trata-se de recurso em Habeas Corpus Nº 173021 – SP (2022/0350155-5), com pedido de liminar, interposto pela defesa do paciente, contra a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo que degenerou a ordem no pedido de Habeas Corpus n. 2181635-11.2022.8.26.0000 originariamente impetrado.
Entenda o caso:
O paciente foi preso provisoriamente pela Guarda Civil Metropolitana de São Paulo em 28/07/2022 por suposta prática do delito previsto no art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006. Consta dos autos de Ação Penal n. 1501370-30.2022.8.26.0628 que durante patrulhamento no local da prisão, o paciente não apenas demonstrou medo, mas dispensou uma sacola, na qual foram encontrados entorpecentes em seu interior na revista pessoal do acusado, cuja diligência continuo com o ingresso dos guardas civis em domicílio do suspeito, sem previa autorização.
A defesa, inconformada com a prisão, impetrou Habeas Corpus no Tribunal de Justiça de São Paulo alegando a existência de constrangimento ilegal do paciente decorrente do desempenho de atividades investigativas e abordagem ilegal realizada por guardas municipais; da violação de domicílio, diante da escassez de elementos quanto ao consentimento do acusado para entrada dos guardas municipais em sua residência; da ausência de provas quanto à autoria; e da carência de fundamentação idônea para a decretação da prisão preventiva do réu, requerendo a imediata expedição de alvará de soltura em favor do recorrente, sem prejuízo da aplicação de medidas cautelares alternativas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal.
O Ministério Público por sua vez, opinou pela concessão parcial da ordem, para que o Juízo competente avaliasse a possibilidade de revogação definitiva da custódia preventiva do paciente, mediante a imposição das medidas alternativas à prisão previstas no art. 319, I, a V, do Código de Processo Penal.
A ordem foi denegada pelo TJSP, alegando que não houve nulidade quanto a ampliação das atribuições dos guardas civis metropolitanos; impossibilidade de concessão de liberdade provisória mediante medidas cautelares; e que a prisão preventiva constitui medida excepcional em caráter preventivo com bases nas graves circunstâncias do caso concreto, às quais revelaram a existência de risco concreto à ordem pública.
Irresignada a defesa interpôs Recurso Ordinário em Habeas Corpus perante o STJ contra a ordem denegatória.
Os autos de ação penal na origem encontram-se conclusos para prolação de sentença.
Da Fundamentação:
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 144, não atribui à guarda municipal atividades ostensivas típicas de polícia militar ou investigativas de polícia civil, como se fossem verdadeiras “polícias municipais”, mas tão somente de proteção do patrimônio municipal, nele incluídos os seus bens, serviços e instalações.
Já o artigo 240 dispõe que as buscas pessoais e domiciliares serão realizadas sob fundadas razões ou suspeitas que as autorizem.
Diante dos fatos narrados, o Ministro Relator Sebastião Reis Júnior, reconheceu em seu relatório, com base em jurisprudências exaradas pela própria Corte Superior, dentre elas o Recurso Especial n. 1.977.119/SP e o Agravo Regimental no HC n. 771.705/SP, a inexistência de qualquer óbice à realização de prisão, em situação de flagrância realizada pelos guardas municipais, mas a ilicitude das provas daí decorrentes, pois o simples fato de o paciente ter demonstrado medo ao avistar a viatura da guarda, jogando para o lado uma sacola, não autoriza a medida invasiva de busca pessoal e domiciliar, estando ausente a razoabilidade da fundada suspeita, conforme prevê o § 2º do artigo 240 do CPP, por não estar demonstrada claramente a relação direta e imediata da diligência com a proteção do patrimônio municipal.
Diz o Ministro Sebastião Reis Junior: “Diante do cenário exposto, no caso, a diligência em questão está eivada de ilegalidade, pois a abordagem foi realizada por guardas municipais, em razão de suposta atitude suspeita do paciente, que dispensou uma sacola ao visualizar a presença da guarnição, o que, além de não consubstanciar fundadas suspeitas para a busca pessoal, não demonstrou relação com suas atribuições de proteção à integridade dos bens e instalações ou garantia da adequada execução dos serviços municipais”.
Da Decisão:
Na data de 12 de maio de 2023, o Superior Tribunal de Justiça, deu provimento ao recurso para anular o flagrante realizado pela guarda municipal, reconhecer a ilicitude das provas por esse meio obtidas, bem como de todas as que delas decorreram, e, por conseguinte, determinar o trancamento do Processo n. 1501370-30.2022.8.26.0628.
PROCESSO RELACIONADO: Habeas Corpus Nº 173021 – SP (2022/0350155-5)
