STJ: Multa por descumprimento de decisão judicial é crédito extraconcursal em recuperação judicial

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

Por: Rafael André Cunha Gomes

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a multa cominatória (astreintes) aplicada pelo descumprimento de decisão judicial tem como fato gerador o descumprimento da própria decisão, e não o contrato que originou a demanda. Dessa forma, quando essa multa decorre de conduta posterior ao pedido de recuperação judicial, o crédito é considerado extraconcursal, ou seja, não se submete ao processo de recuperação.

No caso apresentado, que envolveu um condomínio residencial que processou as construtoras responsáveis por vícios estruturais em seu edifício, a Justiça determinou que as empresas realizassem reparos em caráter de urgência, sob pena de multa diária de R$ 1.000, limitada a R$ 100 mil. Como a ordem não foi cumprida, o condomínio iniciou o cumprimento provisório da sentença para cobrar as multas.

As empresas, que já haviam encerrado um processo de recuperação judicial, alegaram que a multa deveria ser considerada crédito concursal – ou seja, sujeita ao processo de recuperação – porque os problemas no imóvel (vícios construtivos) foram identificados antes do pedido de recuperação. O STJ, no entanto, entendeu diferente.

De acordo com o relator, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a multa cominatória tem natureza distinta da obrigação principal. Enquanto o contrato e os vícios dão origem ao dever de reparar, a multa decorre especificamente do descumprimento de uma ordem judicial. Como essa ordem foi descumprida após o encerramento da recuperação judicial, o crédito não pode ser incluído no processo recuperacional.

A decisão também confirmou que é possível o prosseguimento do cumprimento provisório da sentença, mesmo que ainda exista recurso pendente, desde que o recurso não tenha efeito suspensivo. Porém, o valor da multa só poderá ser levantado após o trânsito em julgado da sentença que a fixou.

O STJ reforçou ainda que as astreintes não têm natureza indenizatória ou alimentar. Elas são um instrumento coercitivo, uma forma de forçar o cumprimento das ordens judiciais, e não se confundem com os direitos materiais discutidos na ação.

Essa decisão é relevante porque delimita com clareza a natureza e o momento do surgimento do crédito oriundo de multa cominatória. Isso influencia diretamente se tal crédito se sujeita ou não à recuperação judicial, com impacto prático para credores, empresas em crise e o Poder Judiciário.

Referência:
Superior Tribunal de Justiça (STJ). Recurso Especial nº 2.169.203 – MG. Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. Julgado em 04/02/2025. Publicado no DJe em 07/02/2025. Documento eletrônico VDA45446730. Disponível em: www.stj.jus.br

Fonte: Superior Tribunal de Justiça.