STJ: Qualificação maior do que a exigida em edital de concurso garante a vaga do aprovado
POR: Sarah Castelo Vaneli
O princípio da vinculação ao edital que exige um perfil para determinado concurso público pode impedir um candidato mais qualificado de assumir a vaga?
O presente caso refere-se a concurso público que exigia, como perfil para vaga, a titulação de curso técnico em Biologia. O candidato aprovado para o cargo, impetrante do mandando de segurança que deu causa ao processo, não possui a qualificação referida no edital, porém, é bacharel e mestre em Biologia.
No ingresso ao cargo, foi encaminhado um ofício do INSTITUTO FEDERAL DO CEARÁ – IFCE informando que o candidato não seria nomeado, visto que a documentação apresentada, o Diploma do Curso de Ciências Biológicas/Bacharelado não estaria de acordo com o edital, ou seja, a formação Técnica profissionalizante na área especificada em Biologia. Em verdade, o edital vincula tanto a administração pública quanto os candidatos ao concurso público como, também, devem ser respeitados os princípios constitucionais da legalidade e da impessoalidade, previstos no art. 37 da Constituição Federal.
Logo, não tendo o candidato comprovado o requisito de escolaridade estabelecida no edital do concurso para se investir no cargo público, como reconheceu o acórdão, há se reconhecer que os comandos legais mencionados foram lesados por este. Assim, o impetrante recorreu da decisão administrativa regional, no intuito de reformá-la. O IFCE, como contra-argumento, afirma que a lógica defendida de “quem pode o mais pode o menos” como consta no processo não se apoia na lei, nem é razoável, tendo em vista a diferença significativa entre o curso técnico e o superior. Outro aspecto relevante é que a participação de candidatos com nível superior em concurso de nível técnico desequilibra sensivelmente a concorrência, inviabilizando a concretização do princípio do acesso ao cargo público previsto no art. 37, II, da Constituição Federal, e ainda o princípio da isonomia, igualdade perante a lei, previsto no art. 5º da Constituição Federal, pois é evidente que o conhecimento de um bacharel é superior a de um técnico. O Ministério Público (custos legis) argumentou que entender de forma diversa casos semelhantes implicaria em esvaziar a primordial finalidade dos concursos públicos, qual seja, selecionar de forma objetiva os mais bem preparados para exercer o múnus público, posicionando-se em desfavor do impetrante.
Porém, o Tribunal Regional da 5ª Região (TRF-5), a despeito dessa incompatibilidade, declarou que não havia qualquer objeção que impeça o candidato de exercer o cargo, tendo em vista que o curso superior é mais abrangente do que o curso técnico exigido, bem como alega que há violação ao artigo 5º, inciso IV da Lei nº 8112/90 que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos, ao admitir que o candidato se invista no cargo sem apresentar a formação profissional exigida no ato convocatório.
Como argumentos favoráveis ao candidato foi apontado que, com base no Decreto-Lei nº 4.657/1942, acrescentado pela Lei nº 13.655/2018 que deu nova configuração à Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB – nos termos do seu art. 20 considera-se que não se pode deixar de registrar que a aceitação de titulação superior à exigida traz consequências benéficas para o serviço público e, consequentemente, para a sociedade brasileira. Tal postura coaduna-se com a previsão do art. 37 da Constituição Federal, que erige o princípio da eficiência da administração pública. Dessa forma, a jurisprudência do STJ (Superior Tribunal de Justiça) é pacífica há bastante tempo. Após firmar-se o precedente vinculante os tribunais locais terão o instrumental para evitar a subida de recursos com o mesmo tema repetidas vezes à Corte.
Nas razões do caso dirigido ao STJ, o IFCE afirma que foram violadas as disposições do artigo 5º, inciso IV, e o art.10 da Lei nº 8112/90, o qual trata do nível de escolaridade exigida para cargos públicos e do art. 9º, § 2º da Lei nº 11.091/2005, que trata de cada fase do concurso público. Desse modo, o impetrante teve a posse indeferida pelo IFCE por não possuir o requisito de investidura previsto no edital, qual seja, “Ensino Médio Profissionalizante na Área ou Ensino Médio completo com Curso Técnico na Área”, tendo apresentado apenas o diploma de Bacharel em Ciências Biológicas.
Mesmo diante da controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça manteve a decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, entendendo que o candidato tem direito à vaga como bacharel e mestre, em que pese o edital vincular a vaga à titulação de técnico. Mas, ressaltou que a regra é de que normas transcritas determinam que a investidura em cargo público apenas ocorrerá se o candidato tiver o nível de escolaridade exigido para o exercício do cargo, conforme estiver previsto no edital do certame.
PROCESSO RELACIONADO: Recurso especial nº 1.903.883 – CE
