STJ: Não se admite responsabilidade penal somente por vínculo com empresa

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

POR: Adriana Dias da Silva

O presente Habeas Corpus, registro nº 185682 – MT, foi impetrado em favor do paciente, contestando decisão que acusava-o da prática de crimes ambientais relacionados ao comércio de 41,423 m³ de madeira em toras, sem a devida licença de origem outorgada pela autoridade competente. A denúncia alegava que os acusados adquiriram e receberam produto florestal sem a licença necessária, infringindo normas de proteção ambiental, além de omitirem informações relevantes sobre o transporte do material, conforme estipulado na Guia de Transporte Florestal (GTF).

A acusação ressaltava que o veículo utilizado para o transporte da madeira não constava na referida guia, configurando, assim, violação das obrigações legais e estatutárias aplicáveis à atividade florestal, considerada de relevante interesse ambiental. O caso chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde o relator, Ministro Sebastião Reis Júnior, analisou a possível ineptidão da denúncia apresentada, com base nas garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa.

Em sua análise, o Ministro Sebastião Reis Júnior destacou que a ineptidão da denúncia fica evidente pela ausência de elementos que estabeleçam uma relação clara entre os acusados e a prática delituosa que lhes é imputada. Segundo a jurisprudência consolidada do STJ, não se pode admitir a responsabilização penal de uma pessoa física apenas com base no vínculo com a empresa, sendo indispensável a demonstração de que essa pessoa teve envolvimento direto e inequívoco com a conduta delituosa.

O relator mencionou a Lei de Crimes Ambientais, enfatizando que a análise da conduta requer um exame detalhado das evidências que comprovem a efetiva participação dos envolvidos na ação criminosa. A falta de menção à licença exigida e ao órgão competente que a outorgou, conforme estabelece o art. 46, parágrafo único, da Lei de Crimes Ambientais (LCA), caracteriza a ineptidão da denúncia, por não atender aos requisitos mínimos que permitam aos réus exercer plenamente o direito ao contraditório e à ampla defesa.

Além disso, o Ministro ressaltou que a denúncia carece de clareza ao descrever o envolvimento dos acusados na aquisição e recepção da madeira supostamente ilegal. A omissão de informações essenciais, como a licença e a inscrição do veículo na GTF, compromete a compreensão da acusação e prejudica a defesa, gerando restrição ao exercício do direito à ampla defesa. A jurisprudência brasileira repele a responsabilização penal objetiva, ou seja, imputar responsabilidade penal a alguém unicamente pela posição que ocupa em uma empresa, sem apontar sua participação pessoal no ato ilícito.

Por fim, o relator frisou a importância das garantias constitucionais no processo penal, enfatizando que a defesa deve ser plenamente informada sobre as acusações imputadas, para que possa exercer o contraditório de forma adequada. A omissão de dados relevantes para a compreensão dos fatos delituosos violaria, portanto, os direitos fundamentais dos acusados, comprometendo a legitimidade do processo penal.

Diante do exposto, o relator concluiu que a manutenção da denúncia, conforme apresentada, configuraria grave violação dos direitos dos réus ao contraditório e à ampla defesa, o que caracteriza sua ineptidão e fundamenta o deferimento do pedido de habeas corpus.

O Superior Tribunal de Justiça, portanto, decidiu pelo provimento do Habeas Corpus nº 185682 – MT, reconhecendo a ineptidão da denúncia e, consequentemente, assegurando a liberdade dos acusados. A decisão reflete a preocupação da Corte com a proteção dos direitos fundamentais e a observância das garantias processuais, consolidando o Estado de Direito no Brasil. A publicação da decisão ocorreu no Diário da Justiça Eletrônico do STJ, sob o código de controle 877da8fe-39f2-4ec7-9615-03bb4bac5179, com data de assinatura em 26 de setembro de 2024.