STF: Tema 1.237 – É dever do Estado indenizar vítimas de bala perdida em operações policiais

Postado por: Francisco Ilídio Ferreira Rocha

Por: Maria Eduarda Borges Monteiro Costa

Neste mês de abril de 2024, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a tese de que o Estado deve ser responsabilizado, na esfera cível, por mortes ou ferimentos causados a indivíduos vítimas de disparos de armas de fogo durante operações de segurança pública. Consequentemente, passa a ser obrigação do poder público indenizar financeiramente a vítima ou seus familiares.

O assunto em questão é o Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1385315 e Repercussão Geral (Tema 1.237), que versa sobre a condenação e responsabilização do poder público ao pagamento de indenização por morte ou ferimento ocorrido durante confronto armado entre criminosos e as forças de segurança pública, quando não for possível determinar a origem do disparo.

O caso concreto se refere à morte de Vanderlei Conceição de Albuquerque, de 34 anos, em junho de 2015, atingido por projétil de arma de fogo dentro de casa, durante uma operação realizada pelo Exército no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. Por entenderem que a União e o Estado do Rio de Janeiro deveriam ser responsabilizados pelos danos que sofreram em razão do confronto armado no local, os familiares da vítima iniciaram ação de responsabilidade civil postulando indenização.

Ocorre que, durante a perícia realizada no processo, não se pôde concluir com certeza se o tiro que causou tamanha fatalidade foi disparado pelos militares do Exército que participaram da operação. Em razão disso, a grande discussão sobre o caso girava em torno do dever do Estado em pagar indenização por morte ou ferimento causado por bala perdida em operação de segurança pública, quando não for possível identificar a origem do tiro.

Por maioria (9×2), o Supremo Tribunal Federal determinou que a União deveria ser responsabilizada pela morte da vítima de bala perdida disparada durante operação militar realizada no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro/RJ. Sobressaindo-se à falta de conclusão na perícia sobre a autoria do disparo, prevaleceu a interpretação de que, dado que a operação foi conduzida por uma força federal, a responsabilidade pela morte recai sobre a União.

Em seu voto, o relator Ministro Edson Fachin, condenou a União a pagar à família da vítima indenização no valor de R$ 500 mil (quinhentos mil reais) e também determinou o ressarcimento pelas despesas com o funeral e o pagamento de pensão vitalícia. A proposta foi confirmada pelo colegiado.

A decisão teve como base o fundamento de que o poder público é responsável por reparar os danos que seus agentes causarem às pessoas, seja por ação ou omissão (art. 37, § 6º, da CF/88). Assim, em caso de morte ou ferimento ocorrido em operação de segurança pública com o uso de armas de fogo, o poder público pode ser condenado a pagar indenização às vítimas ou aos seus familiares. A impossibilidade de identificar de onde partiu o disparo deve ser considerada pelo juiz ao avaliar o caso, mas não é suficiente para afastar a responsabilidade do poder público.

Igualmente, não é possível exigir que, para terem direito à indenização, a vítima ou seus familiares provem que o tiro foi dado pelo policial. O poder público é quem deve demonstrar que seus agentes não causaram a morte ou o ferimento. No caso analisado, como o poder público não provou que os agentes do Exército não causaram a morte, o Supremo Tribunal Federal reformou a decisão da origem para condenar a União (ente público do qual o Exército faz parte) a indenizar os familiares da vítima. O Estado do Rio de Janeiro, no entanto, não foi condenado porque a Polícia Militar (que faz parte do Estado-membro) não participava da operação quando ocorreu a morte.